Jornal de Negócios: Entender o Regulamento Geral de Proteção de Dados Como Fator de Vantagem Competitiva

As organizações que conseguirem antecipar os desafios da proteção de dados, estarão em condições de começar a gerir a mudança de forma mais rápida, deixando para trás aqueles que apenas se regem pela execução legal do regulamento.

O Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD) entrou em vigor há precisamente um ano e veio introduzir um novo regime em matéria de proteção de dados pessoais ao assegurar que os consumidores controlam a forma como as empresas utilizam os seus dados pessoais.

Para muitas empresas, responder às mudanças impostas pelo novo regulamento tem sido uma tarefa complexa. Apesar de o cumprimento do RGPD estar a custar milhões de euros às grandes empresas, algumas olham para estas mudanças além do cumprimento legal, procurando oportunidades para a criação de modelos de negócios inovadores e lucrativos que até então não eram possíveis.

Sem os monopólios de informação, a propriedade dos dados pertence agora aos consumidores e são as empresas que, através da confiança e outros benefícios, terão de se esforçar para obter os seus dados. Dada a importância dos dados dos consumidores para a criação de propostas de valor atrativas, as alterações ao RGPD tornaram-se um campo de batalha entre as empresas.

O caso da renovação das apólices de seguros é um bom exemplo. Durante muitos anos, as seguradoras estabeleceram longos formulários de avaliação e processos de comparação não otimizados para impedir a mudança dos seus clientes para a concorrência no final do período da apólice, gerando assim a maioria dos seus lucros. O RGPD em vigor permite agora aos consumidores solicitar às seguradoras a cedência dos dados a um concorrente.

Para aproveitar esta oportunidade, as organizações um pouco por todos os setores de atividade devem proceder de duas formas. Em primeiro lugar, devem ter a capacidade de gerar confiança junto dos consumidores para gerir os seus dados e de comunicar proativamente as suas medidas de segurança e privacidade, ao mesmo tempo que explicam de que forma estão a ser utilizados os dados. Esta linha de atuação deve funcionar como pré-requisito para qualquer empresa obter dados de consumidores ou até mesmo conduzir um negócio que os envolva.

Em segundo lugar, as organizações devem utilizar os dados com o objetivo de criar propostas de valor atrativas. Após a entrada em vigor do RGPD, os consumidores passaram a compreender melhor o valor dos seus dados e esperam que a sua partilha gere retorno. As propostas de valor podem passar pela experiência (um simples clique em vez de um longo formulário), por serviços adicionais (consultoria especializada) ou por produtos (taxas mais competitivas para produtos financeiros). As empresas que conseguirem atrair os consumidores no sentido de partilharem os seus dados, estarão melhor posicionadas para gerar propostas de valor mais apelativas. A partir daí, cria-se uma espiral positiva de captação de mais consumidores e de mais dados.

Estes são os primeiros passos para tirar partido do RGPD enquanto fator de vantagem competitiva. Podemos ir mais longe e utilizá-lo para criar modelos de negócio inovadores e potencialmente disruptivos. E se um retalhista de confiança ou um banco oferecesse aos consumidores um serviço de partilha de dados, por exemplo? Com o consentimento dos consumidores seria possível compilar os dados pessoais de múltiplas fontes, tais como retalhistas, bancos, seguradoras, empresas de telecomunicações, redes sociais e dispositivos móveis. Este sistema poderia armazenar as informações em bases de dados com garantias de segurança e privacidade, partilhar os dados com uma terceira entidade e garantir que os dados seriam eliminados após a sua utilização.

Tal serviço pouparia tempo ao consumidor no preenchimento de formulários, permitindo-lhe obter melhores produtos e serviços, sem necessidade de analisar individualmente cada uma das empresas ou estar preocupado com o uso indevido dos dados.

As mudanças motivadas pelo RGPD são graduais, uma vez que a relação em torno do consumidor demora tempo a construir. As organizações que conseguirem antecipar os desafios da proteção de dados, estarão em condições de começar a gerir a mudança de forma mais rápida, deixando para trás aqueles que apenas se regem pela execução legal do regulamento.

Kaijia Gu

Partner da Oliver Wyman para a área de Pricing, Sales & Marketing

Artigo de Opinião publicado no Jornal Económico